Desconto para inadimplente pode causar ação judicial.
Os descontos que empresas, principalmente as de cartão de crédito e financeiras, oferecem ao cliente inadimplente quitar os seus débitos, não valem para quem está com as contas do condomínio em atraso.
De acordo com advogados que atuam no setor imobiliário e administradores de condomínio, o síndico que oferecer alguma redução no valor devido pode ser acionado judicialmente e responder de forma cível e criminal pela atitude. “Qualquer condômino que se sentir lesado pela atitude do síndico, ou, até mesmo o seu sucessor na próxima gestão, pode entrar com uma ação questionando o seu posicionamento”, defende o advogado Rodrigo Karpat.
Ele argumenta que o desconto pode abrir precedente e estimular moradores a ficar inadimplentes para pagar as dívidas com desconto. “A proibição não está explícita na legislação, mas o Artigo nº 1.350 do novo Código Civil diz que o síndico tem de aprovar o orçamento de despesa em assembleia.”
Karpat afirma que, normalmente, o que se faz em caso de inadimplência com uma dívida considerável é parcelar o valor. “Claro que a medida deve ser aprovada em assembleia, mas é o mais usual e correto a se fazer”, alega.
Prazo. O morador pode ser considerado inadimplente a partir do primeiro dia após o vencimento da cota do condomínio. Com isso, ele está sujeito a uma multa de 2% e a 1% de juros e correção monetária.
Caracterizada a dívida, o condomínio já pode acionar o morador na Justiça. No entanto, para o advogado, nem sempre é viável entrar com ação logo no primeiro mês. “Se o valor da cota for baixo, não se justifica entrar com ação imediatamente, porque é preciso pagar as custas do processo. Caso seja um valor de R$ 100, por exemplo, o condomínio pode esperar uns seis meses para entrar com a medida. Já se a cota for R$ 5 mil, no primeiro mês já se justificaria o ingresso de uma ação.”
“A nossa orientação é que o síndico nunca dê o desconto. A assembleia pode até aprovar a redução do valor, mas isso pode criar precedente e causar polêmica, já que enquanto o inadimplente não pagou, outros moradores arcaram com as contas por ele. Por isso, não recomendamos dar nenhum desconto”, afirma o diretor de administradoras do Sindicato da Habitação (Secovi), Marco Gubeissi.
Ele afirma que não existe uma pesquisa precisa a respeito dos dados de inadimplência de taxas de condomínio. “Mas calcula-se que ele esteja entre 7% a 10%”, acrescenta.
Na opinião do advogado Bence Pál Deák, se o condomínio estiver com o caixa negativo e precisando do dinheiro, o síndico pode levar a possibilidade de se dar o desconto ao inadimplente para ser votada em assembleia, ou aprovada por uma comissão. “É uma forma de ele se precaver, mas não necessariamente o isentará de uma ação. A medida pode evitar, apenas, que ele seja condenado”, diz.
Profissionais que atuam no mercado dizem que, quando um morador paga uma dívida alta, alguns condomínios dividem o valor recebido entre os moradores que pagaram a cota mais cara durante todos os meses em que houve a inadimplência. A maioria, no entanto, utiliza o dinheiro para fazer melhorias ou obras que são necessárias, mas que vinham sendo adiadas, ou, ainda, para a formação de um fundo de reserva.
A síndica Regina Prado assumiu o posto há apenas dois meses, mas já registrou três acordos judiciais envolvendo débitos. “Optamos por flexibilizar o pagamento em até 12 parcelas para garantir que a conta fosse quitada.”
Avaliação. Ela conta que tudo é avaliado antes de ser feito o acordo. “Se o morador tem dois carros na garagem e vive viajando, a gente não aumenta o número de parcelas. No entanto, se soubermos que ele está passando por dificuldades, seja financeira ou de saúde, optamos pela flexibilização.”
Regina, que antes de ser síndica fazia parte do conselho do condomínio, afirma que desde o início deste ano o edifício já entrou com 25 ações na Justiça pedindo o pagamento da cota condominial de inadimplentes.
O advogado Renato William Yazbek é dono da administradora Yazbek, responsável pela gestão de 15 condomínios. Ele afirma que a regra é não ceder desconto para ninguém. No entanto, quando o valor é expressivo, mediante consulta prévia à assembleia ou ao conselho, o síndico pode autorizar um desconto para recompor o caixa.
“Nunca nenhum síndico dos empreendimentos que eu administro foi acionado por isso. Claro que é preciso comprovar a boa-fé e o interesse em resolver a questão financeira do condomínio, e também que a medida não está sendo efetuada em benefício próprio.”
Ele diz que, atualmente, a inadimplência gira em torno de 10% a 15%, o mesmo patamar do ano passado. Assim como a síndica Regina, ele diz que cada morador que deve a cota condominial é avaliado individualmente. “Avaliamos se ele realmente não tem condições de pagar.”
Depois dessa análise, o corpo diretivo aguarda por três meses para constatar se a dívida será saldada ou não e só então o edifício entra na Justiça.
“Com as alterações que houve de cobrança judicial, ficou mais fácil para entrar com medida judicial. Agora é possível ingressar com uma ação de execução, já que o boleto é considerado um título executivo extrajudicial, o que torna o processo muito mais rápido.”
O professor aposentado José Antonio de Jesus Martins diz que quando comprou seu apartamento, há nove anos, ele tinha uma dívida acumulada com o condomínio de R$ 7 mil. Ele procurou a administradora para negociar e conseguiu pagá-la por R$ 5 mil. “Eu propus quitar a conta à vista. Eles acharam que era mais vantajoso do que pagar advogado e as custas processuais.”